terça-feira, 4 de maio de 2010

Os tambores de Nietzsche

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Recentemente, através do Youtube, deparei-me com uma cena, no mínimo, inusitada: uma famosa cantora gospel brasileira, em um show (que insistem em chamar de “ministração”) começou a afirmar que, ao som dos tambores que seriam tocados pelos seus músicos, as potestades do mal seriam destronadas em nosso país, Satanás e seus asseclas seriam eternamente envergonhados, e o nome do Senhor seria exaltado. Infelizmente, não sei se isso ocorreu antes da avalanche de escândalos morais no Congresso Nacional. Porém, o que vi é que, ao serem tocados os tambores, houve um frenesi, tanto na platéia como no palco: a cantora, sem muita intimidade com instrumentos de percussão, começou a “surrar” um gongo chinês, atravessando todo o ritmo, repetindo, a todo tempo, os mantras “o Brasil é de Jesus”, e “diabo, você está derrotado”.
Sinceramente, sinto-me meio sem rumo. Em minha conversão, há 22 anos atrás, nunca esperaria ver um ritual de macumba gospel palatável à burguesia divulgado pela internet. Ao formar-me no seminário e assumir uma igreja como pastor, e lá se vão quase quatorze anos, não pensava em concordar tão prontamente com a banda de hip hop Apocalipse 16, quando canta “Meus inimigos estão no poder”.

É triste pensar no cristianismo evangélico atual no Brasil. Tornamo-nos pastiche de uma religiosidade irrelevante – e, o que é pior, tornamo-nos prato cheio para uma mídia com má vontade e sedenta de escândalos. Afinal, nos mais recentes escândalos no país, evangélicos estão envolvidos de forma negativa: a acusação contra um deputado federal, líder de uma denominação, que pagou para um pistoleiro matar outro deputado, também pertencente à sua agremiação religiosa; o caso do senador Renan Calheiros, Mônica Veloso, a repórter que não sabe fazer planejamento familiar ao engravidar do poderoso político meio sem querer, afirmou ser, de acordo com entrevista dada ao jornal Folha de S. Paulo, “evangélica, batista, do Vale do Amanhecer”. Isso sem contar, obviamente, os panetones ungidos do Arruda e os assaltos à bolsa alheia feitas pela teologia da prosperidade, que precisa de jatinhos e horários na TV para sobreviver.

Friedrich Nietzsche é um nome que causa arrepios entre nós, nem tanto por sua colaboração filosófica vital ao nazismo, mas mais por sua virulência contra o cristianismo protestante, atacando sem dó nem piedade a moral e os valores cristãos. Para ele, a figura de Jesus é o retrato mais bem acabado do fracasso e da derrota. Esta moral deveria ser suplantada por uma outra. Para tanto, ele propunha a nova moral, a nova ética, a partir do super-homem. Mas, para que tal intento tivesse sucesso, era necessário ter a consciência de que Deus, a fonte da moralidade cristã, morreu. Ele mesmo escreveu, em um de seus textos: “Deus morreu e nós o matamos! Sinta o cheiro da putrefação divina!”

Será que Nietzsche estava, afinal, certo? Será que Deus realmente morreu? Afinal, qual a relevância de Deus para o movimento evangélico de hoje? Qual a relevância dos valores do Evangelho do Reino, reduzidos a um mero exorcismo com tambores em um show gospel mal tocado? Aquilo que aprendemos nos domingos, em nossas comunidades, é praticado no dia a dia? E, aquilo que aprendemos é realmente aquilo que se encontra na Sua Palavra? Deus é relevante, ou se torna figura de retórica, pedra de toque, fetiche religioso para manipulação mágica do mundo espiritual, como O temos reduzido ultimamente?

Se não retornarmos (ou melhor, nos convertermos) ao Evangelho do Reino, abandonando o falso evangelho da macumba gospel, infelizmente, seremos obrigados a imaginar Nietzsche, com aquele bigodão de vassoura, dando folgadas gargalhadas no inferno e gritando em alemão: “eu venci!”. Que possamos ser realmente sal em um mundo apodrecido e luz no meio das trevas religiosas. Que o Senhor tenha misericórdia de nós.

Digão


O Genizah impediu que o tamanho da barba do Digão chegasse perto do tamanho do bigode de Nietzsche
Fonte:Genizah 

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