quinta-feira, 6 de outubro de 2011

Ilegais, graças a Deus

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Visitei uma igreja brasileira nos arredores de Boston, uma região nos Estados Unidos com cerca de 250 mil imigrantes tupiniquins. Segundo Manoel Oliveira, pastor presbiteriano em Framingham, pode-se creditar o início dessa migração a duas mulheres do interior de Minas que foram como empregadas domésticas à convite de famílias americanas. As duas andorinhas fizeram verão.

Nunca vi com simpatia estes grupos de imigrantes. Estive por alguns meses em Miami dirigindo um curso para latinos, entre eles muitos brasileiros. Visitei igrejas latinas e brasileiras nas quais a teologia situacionista me enojava. Tentei, sem sucesso, entender a lógica da ilegalidade conveniente, a subserviência dos subempregos, as dolorosas separações familiares. Contudo, meu preconceito só foi confrontado quando comecei a estudar na Palavra o papel das nações. São milhares de passagens que nos falam sobre as nações e a relação entre elas.

Deus foi o primeiro promotor das correntes migratórias. A Terra Prometida já era habitada — não era uma “terra virgem”. Deus promete expulsar algumas nações, e ainda diz que é por causa da impiedade delas (Dt 9.5). Promete que Israel possuiria, abençoaria e emprestaria a muitas nações. Israel dominaria, mas não seria dominada. Porém, como todo “domínio” da parte de Deus, não seria tirano. Eles abrigariam o estrangeiro com a mesma diligência e carinho que deviam a seus próprios órfãos e viúvas. A benção de Deus a Israel nunca foi exclusiva, mas globalizada em seu DNA.

Estudos científicos sustentam a ideia de que os homens migram há mais de 40 mil anos. O DNA mitocondrial confirma que nem os grupos hoje aparentemente isolados geneticamente escaparam da mistura inevitável e profusa das “raças” humanas.1 Os portugueses viveram por 700 anos misturados às tribos árabes e já tinham o hábito de se casarem com outros antes mesmo de chegarem ao Brasil. Os anglo-saxões, arianos, enganados pela falácia de pureza racial, são uma mistura de dezenas tribos diferentes.

O “apartheid” sul-africano, tão símbolo de intolerância quanto o antissemitismo de Hitler, tratava mal não só os negros, mas também os imigrantes (indianos, chineses, portugueses) e foi substituído durante algum tempo pela política de fronteiras abertas. As riquezas da África do Sul seriam usufruídas e aumentadas por imigrantes bem recebidos de toda a África. Coisa de Mandela, que entendeu o coração de Deus para as nações mais do que os pastores reformados do “apartheid”.

Milton Santos diz que a “a circulação é mais criadora que a produção”. O imigrante é o homem em movimento, sem passado porque desterritorializado e desculturado, que realiza sua consciência no futuro e no aprendizado da nova terra. “Quanto mais instável e surpreendedor for o espaço, tanto mais surpreendido será o indivíduo, e tanto mais eficaz a operação da descoberta.”2 O imigrante, em todas as nações, é a esperança do novo, da criação, da reforma do lugar comum.

Os Estados Unidos estão em decadência. Casas residenciais indo a leilão, negócios falindo, fachadas com pintura gasta, lixo nas ruas. Os princípios que enriqueceram a nação estão sendo enterrados por um secularismo cético. Neste momento a comunidade brasileira redimida por Jesus, e as diversas comunidades estrangeiras que se encontraram ali com a fé cristã, se tornam a esperança de futuro. Olham a crise com esperança, e se equipam para a prosperidade, se desvencilhando de suas prisões culturais territoriais para se conformarem à fé genuína capaz de levar-lhes a, como Israel, abençoar não só a si mesmos, mas à nação que os hospeda. Migração, diversidade e mistura entre os povos é coisa de Deus. Coisa dos homens é fechar fronteiras.

Bráulia Ribeiro

Fonte:Solomon

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